segunda-feira, 3 de maio de 2010

Tese contrária

Existe um movimento que não sei bem por onde começa mas de certa forma espera que alguém tome a iniciativa de começar.

Dia desses uma amiga que adoro esteve lá em casa tomando um café e contou de uma experiência que passou e que foi de extrema importância para uma mudança geral em sua vida, ela é actriz, não lhe faltam trabalhos, amigos ou pessoas com envolvimentos profissionais com quem vive uma espécie de vida em zona de conforto.

Mas ela se culpava de talvez não preencher as expectativas alheias e mesmo tendo uma personalidade forte e já não viver a passividade dos tempos em que iniciou sua carreira profissional, achava que poderia fazer melhor mas não sabia como.

O meio artístico é uma selva. Cobra engolindo cobra. E se você não entra no jogo, ou é um génio subsidiado pelo destino ou a pessoa desprovida de carácter e responsabilidade. Não tem meio-termo. Se correr o meio te pega se ficar os colegas te comem.

Mas quando se é “artista” não tem jeito. Ou você finge que é “normal” ou é tido como uma expecie de cliché dos palcos.

Ela teve que aceitar papéis em comédias comerciais, fazer uma personagem na novela que quebrava todos os seus conceitos, mendigar pontas em sitcoms sem grande êxito, participar de um fracasso de bilheteira que rendeu uma dívida com a sua mãe que pagou os direitos autorais do texto e fingir que tava tudo bem (ao menos algumas contas estavam pagas).

Namora um advogado há três anos que conheceu a almoçar num centro comercial ao pé do Vilaret onde estava a ensaiar um espectáculo.

No tal dia da experiência o rapaz passou na porta do estúdio onde minha amiga estava a gravar para a dar a boléia quotidiana e viu-se preza a uma insegurança que era apenas reflexo da situação geral que sua personalidade representava em cima do palco que sua existência tinha se tornado.

Dentro do carro a caminho de casa ouvia mesma conversa detalhada e aborrecida do dia de trabalho do seu namorado, enquanto fingia que estava interessada tentava humedecer os lábios secos, não ascender o terceiro cigarro e rezar para os olhos não estarem muito vermelhos. Não queria que o cara percebesse que ela tinha fumado um charuto com o actor que fazia seu marido na novela.

Chegou em casa totalmente desnorteada, sem saber ao certo se tinha passado batida, estava cansada de fingir que a vida estava no sitio certo. Queria poder ser ela mesma, fumar seu bom charro antes de ensaiar, fazer apenas o teatro da qual é apaixonada, ter tempo pros amigos mas sem o peso de que esse tempo fosse preenchido com programas que não estava afim de fazer. Queria ter tempo para estar sozinha uns instantes... pra poder assistir a três ultimas temporadas de Lost que a meses adormecia em cima do aparelho de DVD... fazer de um sábado uma ilha de email respondidos... essas coisas que parecem sem importância mas moem a cabeça de qualquer um...
Resolveu não ter sono, passar a noite planeando fugas. Amanheceu certa de que não queria acordar como nos outros dias. Precisava de um tempo só para ela, mas, se tivesse pedido a opinião de um dos amigos, teria fugido para o Porto por um final de semana. Ao invés disso, foi sozinha há uma estação imaginária, comprou um bilhete para uma cidade nova que só ela conhece pois esta situada num país de um planeta que ela criou em sua alma e decidiu viajar... passou semana passada pra tomar um café comigo, para se despedir de mim e deixar algumas pistas com a morada nova. Seu desejo é que eu a visite algumas vezes.

Como eu invejo sua coragem. Sabendo que essa sua cidade é tão liberal para sua forma de viver a vida, minha amiga. Quem sabe um dia eu não seja Presidente desse pais que você virou cidadã. Me manda notícias. Não me venha visitar, quando a saudade apertar eu visito você

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